Escolas transformam xadrez em aliado do ensino interdisciplinar
Luis Ribeiro / Prefeitura de São José dos Pinhais.
Em São José dos Pinhais, o xadrez deixou de ser apenas um jogo para se tornar política pública — e exemplo para o Brasil. Formalizado por meio da Lei n.º 4.001, de junho de 2022, e pelos decretos municipais n.º 6.067 e n.º 6.068, de junho de 2024, o Programa Mente Ativa de Ensino e Aprendizagem do Jogo de Xadrez (PMAX) organiza, fomenta e sistematiza ações pedagógicas, culturais e esportivas com o jogo.
O que antes era uma série de iniciativas pontuais agora compõe uma engrenagem robusta que movimenta escolas, professores, famílias e milhares de estudantes.
“A proposta é fazer do jogo uma ferramenta educacional, terapêutica, cultural e de lazer. Um direito e não um privilégio”, explica o coordenador do Programa Cultura de Jogos e representante do PMAX na Secretaria Municipal de Educação (Semed), Vinicius Silva Rodrigues dos Santos.
O xadrez, segundo Vinicius, ajuda os estudantes a desenvolverem o raciocínio lógico, paciência, concentração, na tomada de decisões e também contribui para a socialização. Atualmente, o município realiza o maior Circuito Escolar de Xadrez da América Latina, sendo que algumas etapas contam com mais de 1.500 participantes. Além disso, o município vem acumulando títulos estaduais, nacionais e até sul-americanos.
2ª Etapa do Circuito Escolar de Xadrez 2025 reúne mais de 1.350 estudantes em São José dos Pinhais
Um bom exemplo é a história de Gustavo Horokoski de Souza, 28, professor de xadrez no município e que leciona a prática na Escola da Colina e no Colégio Militar de Curitiba. Ele iniciou sua participação no Circuito Escolar de São José dos Pinhais quando eram 300 jogadores e frequentava o clube do município diariamente. “Comecei a jogar xadrez na adolescência e desde então ele se tornou parte da minha vida. Me orgulho muito em dizer que sou o primeiro aluno do clube de xadrez de São José dos Pinhais”, conta.
Com o tempo, Gustavo se destacou e teve conquistas importantes, conheceu outros estados brasileiros participando de competições e tornou-se Mestre Nacional de xadrez. Depois, começou a lecionar. “Tive experiências muito enriquecedoras dando aulas e hoje tenho a oportunidade de trabalhar com isso e ver, todos os dias, como o xadrez pode abrir portas e transformar histórias, assim como transformou a minha”, complementa.
Os irmãos Oswaldo Pirola Gonçalves, 22, e André Luiz Pirola Gonçalves, 17, também participaram dos circuitos e das aulas oferecidas no Clube de Xadrez de São José dos Pinhais, já foram reconhecidos por suas habilidades e ganharam medalhas e troféus em competições pelo país. Eles contam que sempre tiveram auxílio e apoio dos técnicos do PMAX, tanto nos deslocamentos quanto na preparação para as partidas.
Oswaldo é engenheiro de software e menciona que gostou muito de participar do programa e que a experiência serviu de base para grandes conquistas em sua vida, tanto intelectualmente quanto emocionalmente. “Grande parte da minha lógica avançada acredito que foi construída pelo xadrez. Só tenho elogios à iniciativa, pois sempre me apoiaram em todos os quesitos, tanto em torneios locais quanto em viagens”, conta.
André, estudante de Análise e Desenvolvimento de Sistemas, leciona aulas voluntárias e particulares de xadrez. Ele começou a jogar com 6 anos de idade e o segundo campeonato que participou foi um brasileiro. “Fiquei em último lugar. Depois disso, comecei a treinar e me dedicar e hoje sou bicampeão paranaense de Xadrez. Além disso, ganhei mais de 20 vezes como o melhor jogador de São José dos Pinhais, Curitiba, Ponta Grossa, Piraí do Sul, Minas Gerais, entre outras cidades”, finaliza.
Sobre o PMAX
Por meio do PMAX, ainda são promovidas oficinas em escolas de tempo integral, produzidos materiais pedagógicos, incentivado o desenvolvimento de pesquisas em parceria com universidades e capacitação de educadores de diferentes áreas — de professores de Educação Física a psicólogos que atuam nos CRAS e CREAS.
As formações são organizadas pela Secretaria Municipal de Educação (Semed), que atua em conjunto com as secretarias de Cultura (Semuc), Esporte e Lazer (Semel) e Assistência Social (Semas).
Gustavo Horokoski de Souza afirma que o PMAX é uma iniciativa fundamental, que não apenas facilita o acesso ao xadrez, mas integra áreas importantes como educação, esporte, cultura e assistência social.
“Isso potencializa o impacto do programa na formação integral dos estudantes. Não vejo nenhuma outra cidade no Brasil que consiga promover capacitações para os professores da rede municipal, desde a educação infantil até o nível mais avançado, que realize eventos com mais de 1.500 crianças participando, que confeccione e trabalhe atividades exclusivas do xadrez na cultura dos cidadãos. Ver de perto a evolução do xadrez no nosso município tem sido uma experiência enriquecedora”, enfatiza o professor.
Quem também é entusiasta e se deixou conquistar pela iniciativa é a professora de Educação Física, Viviane Aparecida Ferreira. “Eu não sabia jogar xadrez, nem queria aprender. Achava difícil demais. Mas quando começaram as formações, a pedagoga da escola insistiu tanto que acabei cedendo. Me apaixonei pela metodologia. Fiz duas formações só para me sentir segura, e hoje dou aula para todas as turmas da escola”, conta.
Uma rede de ensino pensante
O ensino do xadrez, como propõe o PMAX, não se limita à lógica das regras. Está inserido em uma perspectiva abrangente de jogo, que desenvolve habilidades socioemocionais, cognitivas e comportamentais. Autonomia, pensamento crítico, criatividade, empatia, cooperação e a valorização da diversidade são alguns dos pilares do programa.
Viviane percebe isso na prática. “Eles desenvolvem raciocínio lógico, atenção, memória, capacidade de resolver problemas. E o mais importante: aprendem a perder. A ter resiliência. A continuar tentando”, conta a professora, que uma vez por mês dedica suas aulas de Educação Física ao xadrez.
A professora de matemática Juliana Augusta Gonçalves, 48, também integra os ensinamentos sobre o xadrez de forma interdisciplinar. Ela explica que dedica uma das cinco aulas que ministra semanalmente à prática da modalidade, e conciliando com o desenvolvimento de uma das habilidades necessárias para compreensão e desenvolvimento das disciplinas de forma assertiva.
“Conheci o programa em 2015, dentro do Projeto Mais Educação. Naquela época foi um dos grandes desafios que encontrei: ensinar Xadrez para crianças com dificuldade acentuada na aprendizagem. Com o tempo, descobri que o xadrez acelera a capacidade cognitiva e ajuda os estudantes na conquista da autoestima”, enfatiza
Além das unidade municipais de educação, a prática de xadrez também é incentivada em praças, parques e equipamentos por meio da Secretaria Municipal de Cultura (Semuc), em espaços de atuação da Secretaria Municipal de Assistência Social (Semas) e Centros e Núcleos da Secretaria Municipal de Esporte e Lazer (Semel).
O PMAX segue crescendo, movido por um propósito claro: tornar o xadrez uma linguagem acessível, plural e formativa. Uma política pública que promove não apenas campeões de torneios, mas protagonistas da própria história.
Fonte: G1 Paraná